Um coletivo para fomentar a arte e a consciência ambiental

Nas margens do Canal São Joaquim, no Barreiro, uma pequena casa abriga diversos materiais: ferramentas, móveis, objetos doados ou recolhidos em lixões e já transformados em instrumentos musicais ou aguardando um novo destino artístico. Itens que para muitas pessoas é apenas entulho, mas que para algumas representa cultura, cidadania e esperança.

A casa, que fica na esquina da Passagem Mirandinha com o canal, é a sede do Núcleo Socioambiental e Cultural São Joaquim. É lá que encontramos o seu Manoel Fonseca, marceneiro, músico e coordenador do Núcleo. Ele explica que o objetivo da iniciativa é agregar a juventude e poder fazer cultura, atividades ecológicas, sociais e culturais. “É um esforço que a gente faz para poder juntar esses garotos que têm talento. Aqui se tornou um espaço de agregação de pessoas talentosas. Todo mundo que frequenta aqui, que faz alguma atividade, pratica alguma arte. O cara de faz malabarismo, por exemplo, pinta e esculpe”, nos conta Manoel.

Diversos itens são guardados e reaproveitados pelo Núcleo São Joaquim. Foto: Deco Barros.

Manoel Fonseca, que é marceneiro, faz ajustes em instrumento musical na sede do Núcleo. Foto: Deco Barros.

O Núcleo São Joaquim reúne atualmente 15 artistas do Barreiro. Ao lado do apelo artístico e cultural que mobiliza o grupo, está também o social e ambiental. Segundo Manoel, o núcleo existe com esse nome desde 2010. Mas o ativismo em torno do Canal São Joaquim existe há mais de 20 anos, quando surgiu o sonho de tornar o canal navegável. “Em 2010 criamos esse nome, para podermos juntar as pessoas, praticar esse ativismo, que foi inicialmente para tratar da situação do canal”, relembra.

 

Cidadania ambiental

Do sonho de tornar o canal navegável, o grupo percebeu que existiam outros problemas ambientais a vencer. Um deles é o tratamento de esgoto, esperado durante a execução do projeto da Macrodrenagem do canal, mas que nunca aconteceu. Como acontece em quase toda a cidade de Belém, todo o esgoto residencial é despejado direto naquele que deveria ser um rio limpo.

Ação de limpeza do lixo na esquina do Canal São Joaquim com a passagem Mirandinha. Foto: @nucleosaojoaquim

Manoel explica como é feito o reaproveitamento de objetos doados ou retirados do lixo. Foto: Deco Barros.

Mas a luta continuou, e ganhou força em outras frentes. Um dos principais objetivos da iniciativa, por exemplo, é criar uma consciência ambiental na comunidade e garantir que o poder público faça a sua parte nesse sentido.

Manoel explica que o problema do lixo, por exemplo, vai muito além de uma suposta “falta de educação da população”. “O lixão acontece porque a via não possibilita o carro do lixo passar. Esse projeto, chamado Coleta Alternativa, vai disponibilizar um carrinho para ir três vezes na semana para coletar esse lixo onde o caminhão não entra, para deixar num ponto onde ele passa”, nos conta esperançoso sobre uma das ações previstas. Ele explica que quem vai pagar esse trabalho é a própria comunidade, com a ajuda de doações de parceiros comerciais.

 

Um ponto de efervescência cultural

Outra frente de atuação do projeto é a cultura. “A gente é envolvido com a cultura musical, com a pintura, todos esses eventos culturais e a questão social também, desde sempre”, comenta o coordenador.

Manoel toca curimbó em meio a outros instrumentos musicais que esperam por conserto. Foto: Deco Barros.

Manoel explica que o Núcleo incentiva a participação da juventude nesse ativismo cultural porque é por meio deles que a cultura tradicional poderá se manter viva. Além disso, é possível aliar a arte às questões ambientais e envolver esses jovens nesse debate. “É fácil da gente encontrar pessoas que tenham vontade de fazer alguma coisa pela sociedade com um gênero musical apurado. A gente vê garotos que têm vontade de aprender a tocar carimbó, aprende, toca e depois ele quer participar das atividades sociais e ambientais, porque uma coisa liga à outra. O carimbó raiz, por exemplo, fala do lixo nos igarapés, da floresta, das lendas. Então acaba sendo um evento propício e educativo para as crianças”, explica.

Móveis são retirados do lixo e reaproveitados.

Ao ligar todos esses pontos, meio ambiente, saneamento, cultura, arte, música regional, juventude, direitos humanos, o Núcleo costura essa rede de cidadania cujo principal objetivo é proporcionar dignidade para a população da periferia. “Viver melhor numa comunidade onde não tenha repressão policial e discriminação da pobreza. A gente tenta não permitir que marginalizem o povo periférico”, conclui Manoel.

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